Bate-Papo com Augusto Cury

 Augusto Cury



Psiquiatra, psicoterapeuta e
escritor, Dr. Augusto Cury foi considerado o autor mais lido da última década,
com mais de 30 milhões de livros vendidos somente no Brasil. Suas obras são
best-sellers e premiadas em vários dos mais de 70 países onde são publicadas.





Um dos poucos pensadores atuais
que possui doutorado e mestrado internacionais que se baseiam em sua teoria,
denominada Teoria da Inteligência Multifocal
, que analisa o processo de
construção dos pensamentos, o funcionamento da mente humana e as estratégias
para a conquista de uma mente livre e saudável.





Idealizador dos maiores programas de educação
socioemocional, Escola da Inteligência e Gênios Educacional, impactando mais de
um milhão de pessoas anualmente em escolas públicas e privadas.





Ele gentilmente, concedeu
entrevista para o Almanaque Educação de Araçariguama.



Vandi Dogado – Você tornou-se o autor mais lido da década, a que
atribui o sucesso de suas obras?



Augusto Cury – Baseado nas
mais de vinte e cinco mil sessões de terapias realizadas em meu consultório e
na minha trajetória enquanto pesquisador científico e produtor de conhecimento
sobre o fantástico funcionamento da mente humana, pude perceber alguns aspectos
que despertaram a minha preocupação e a necessidade de minhas obras.





A sociedade moderna está
adoecendo cada vez mais, pensávamos que a nossa geração seria aquela que
viveria o oásis do prazer e da tranquilidade, porém nos enganamos, jamais fomos
tão tristes e inseguros.





Somos mais de 7 bilhões de pessoas
no mundo. Mas, na atualidade, vivemos a mais triste solidão. As pessoas estão
sozinhas nos elevadores, no ambiente de trabalho. Estamos rodeados de pessoas,
mas sós no meio da multidão.





Outro fator e, este considero um
dos mais importantes: a falta de diálogo. Muitos só sabem falar de si quando
estão diante de um psicólogo ou psiquiatra. Raramente, pais e filhos cruzam
suas histórias e trocam experiências. Aprendemos a explorar o mundo. Sabemos
sobre planetas do sistema solar, estudamos os átomos e temos acesso a milhares
de informações em apenas alguns segundos. Uma criança de 6 anos já tem mais
informações que um imperador romano, no auge de Roma. Temos acesso a um vasto
conteúdo, mas não sabemos pensar, transformar a informação em conhecimento e
experiências. 





Com o avanço da tecnologia e da
medicina, desenvolvemos vacinas para todos os tipos de doenças, inclusive a
covid-19. Mas, quantas delas nos previne do estresse e das frustrações? Vivemos
em uma era, onde o normal tem sido ser ansioso, estressado e excessivamente
preocupado, já o anormal tem sido ser tranquilo e relaxado.





Sou apaixonado pela espécie
humana, por isso, me importo com a qualidade de vida das pessoas, mesmo
daquelas que não conheço. É meu dever contribuir para uma sociedade emocionalmente
mais saudável, com mais prazer de viver, diminuindo a solidão e promovendo o
diálogo, enriquecendo a arte de pensar, debater ideias.





Cada vida é única e
insubstituível, e minha missão é plantar no coração psíquico de cada leitor, as
sementes certas para que aprendam a ser autores de suas histórias, desenvolvam
a arte de contemplar o belo e expandir o prazer de viver, construam habilidades
socioemocionais para gerenciar os pensamentos e emoções e muitas outras. 





Por meio dos meus livros tenho o
desejo de democratizar a ciência e torná-la acessível ao maior número de
pessoas, para que possam ter as ferramentas certas para serem líderes de si
mesmas e conscientes de que são uma joia única no teatro da existência.



Vandi Dogado - Nos últimos dois anos, o mundo passou
pela mais grave crise do século. Além dos prejuízos no processo de
ensino-aprendizagem, os alunos retornaram às aulas com diversos ‘problemas’
socioemocionais. Quais seriam as prioridades a serem trabalhadas por educadores
nas escolas, de acordo com sua experiencia, pensando inclusive, que os
professores também foram atingidos e encontram-se adoecidos?





Augusto Cury – Neste
momento pós-pandêmico, mais do que nunca percebemos o impacto da SPA ou
Síndrome do Pensamento Acelerado, nas crianças, nos jovens e nos educadores.
Ela é causada por meio do excesso de informações, que vem das mídias sociais,
da televisão, bem como do excesso de atividades e de videogames.





Em minhas conferências com
líderes de escolas, juízes e magistrados, sempre digo que as crianças estão
vivenciando um cárcere mental em que possuem tempo para tudo, exceto para viver
a infância. Esse excesso de estímulos é registrado no córtex cerebral por meio
do fenômeno RAM (Registro Automático da Memória), o grande biógrafo do cérebro.
Já o gatilho mental, outro fenômeno que atua na construção dos pensamentos, é
disparado freneticamente diante dos estímulos contínuos, como as telas dos
dispositivos eletrônicos, abrindo diversos arquivos e janelas, que são lidos e
relidos em milésimos de segundo, levando à hiperconstrução de pensamentos.





Essa sobrecarga de informações
aflora ainda mais os sintomas da SPA, causando uma mente inquieta, esgotamento
físico e emocional, dificuldades de convivência, sofrimento por antecipação,
déficit de concentração e déficit de memória. Por desconhecerem o funcionamento
da mente, médicos do mundo todo estão confundindo a Síndrome do Pensamento
Acelerado com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Ainda
que os sintomas sejam semelhantes, as causas são distintas. Dessa maneira,
apenas entre 1% e 2% das crianças têm hiperatividade, que geralmente tem raiz
em causas genéticas como um pai, mãe ou avós mais inquietos. Mas, infelizmente,
crianças e jovens estão sendo medicadas com “drogas da obediência” sem qualquer
necessidade e com consequências graves.





Os professores são cozinheiros do
conhecimento que preparam uma refeição completa para uma plateia de alunos que
não tem apetite. O motivo disso? A SPA e a intoxicação digital. Por isso, tenho
recomendado que nossas crianças precisam relaxar, brincar, praticar esportes,
contar e ouvir histórias. É preciso reaprender a desfrutar da vida sem medo,
pois viver é um contrato de risco, as cláusulas mais importantes não foram
escritas. Pequenas contrariedades hoje causam grandes impactos, pequenas
decepções geram grandes descontroles. É importante ensinar aos alunos que drama
e comédia fazem parte da nossa existência.





Para isso, educadores brilhantes
precisam conhecer, vivenciar e colocar em prática as ferramentas de gestão da
emoção. Técnicas essenciais que, se fossem aplicadas nas escolas, universidades
e nos lares familiares, teríamos uma geração de pessoas emocionalmente
saudáveis. Aqui citarei as três mais importantes: o Eu como consumidor
emocional responsável, o D.C.D (duvidar, criticar e determinar) e a Mesa
Redonda do Eu.





A primeira, consiste em uma
técnica emergencial, que tem como objetivo filtrar os estímulos estressantes e
proteger a emoção à medida que educamos a mente a não “comprar” discussões,
conflitos e atritos que não produzimos. Já a segunda técnica, deve ser
utilizada nos momentos de tensão e serve para reeditar as janelas killer ou
traumáticas. Por meio dela, aprendemos a não agir e reagir, mas, sim, utilizar
o silêncio psíquico para duvidar de tudo que nos controla, como os medos e
falsas crenças, criticar pensamentos não saudáveis que são destrutivos para,
assim, deixar de ser espectador passivo dos acontecimentos e passar a
determinar ser o autor da própria história.





Na terceira técnica, aprendemos a
construir janelas ou plataformas de janelas saudáveis, que vão financiar a
alegria e o bem-estar. Nela, o Eu, que representa a nossa vontade e capacidade
de escolha, ganha musculatura para fazer um autodiálogo inteligente com os
fantasmas mentais, as fobias, a impulsividade e ansiedade para questionar esses
pensamentos e emoções, e criticar verdades, de repensar a vida e refazer
caminhos. Ela é mais profunda, intensa, sendo um passo além da técnica do
D.C.D. 





Essas técnicas são
poderosíssimas! Com elas, podemos desenvolver uma personalidade mais segura,
saudável, proativa e criativa.

Vandi Dogado – A guerra entre Rússia e Ucrânia e a ascensão de ideias
totalitárias no mundo também produziu um ambiente de incertezas nas populações
mundiais. Acredita que isso possa influenciar nas perspectivas de crianças e
adolescentes sobre o futuro? Nesse sentido, qual o papel dos professores?





Augusto Cury – É
importante compreender que existem em nossa psique, diversas janelas doentias,
como as fóbicas, que geram claustrofobia, fobia social, pensamentos que
financiam o ódio, a raiva e a intolerância. Por isso somos uma espécie com a
capacidade de produzir poesias e, ao mesmo tempo, capaz de fazer guerras,
destruir, ceifar vidas e dominar sem qualquer racionalidade. A janelas killers
bloqueiam a inteligência, sequestram a nossa lucidez.





Batalhas em grandes nações, como
a que estamos vendo na atualidade, acontecem em razão do homo sapiens
ser dominado pelos instintos animais do homo bios, aquele que faz a
guerra e causa a destruição.





Se ensinarmos nossos alunos a
lidar com as emoções de forma inteligente, eles não se tornarão vítimas das
janelas killers. Por meio de algumas das técnicas que descrevi, não apenas
doenças seriam resolvidas, mas conflitos sociais deixariam de existir.





Com a gestão da emoção, nossa
sociedade seria livre das discriminações e do preconceito, honrando o grande
espetáculo que é a vida e nossa incrível capacidade de pensar, afinal, no
teatro da mente somos todos igualmente únicos. Seres humanos pertencentes a uma
única e fascinante espécie.



Vandi Dogado – O neurocientista francês Michel Desmuget
em seu livro A Fábrica de Cretinos Digitais: os perigos das telas para nossas
crianças, enfatiza que o excesso de uso de tela digital (celulares,
computadores, televisão) tem diminuído a inteligência de indivíduos da Geração
Z, contrariando outros neurocientistas. Qual sua opinião sobre o uso das novas
tecnologias da informação e comunicação?





Augusto Cury – Por um
lado, o mundo digital e o acesso às novas tecnologias elevou a produtividade
das empresas e a expansão da comunicabilidade, por exemplo, com os aplicativos
de mensagens instantâneas, em que é possível falar com pessoas no mundo todo.
Mas, por outro lado, o mundo digital pode mexer com o ciclo da dopamina e
serotonina, que são neurotransmissores do córtex cerebral, que podem gerar uma
dependência, tal como as drogas psicoestimulantes. Tire o celular de um jovem
de 13, 14 anos e provavelmente você verá sintomas semelhantes à dependência
como, irritabilidade, angústia, sono, vazio existencial.





Com a síndrome da intoxicação
digital, aceleramos a capacidade de produzir pensamentos, diminuímos a
capacidade de suportar contrariedades e geramos uma dependência psicológica
atroz.





Para combater isso, devemos
aprender e estimular nossas crianças e as pessoas ao nosso redor a desacelerar
os pensamentos, desenvolvendo a habilidade de contemplar a beleza que existe em
cada um e no mundo, aprender a fazer muito do pouco, a praticar a
interiorização e praticar o autodiálogo.





Vandi Dogado– Gostaria de agradecê-lo pela entrevista e pedir que deixe
um recado de esperança para os profissionais do magistério e, principalmente,
para os alunos do Sistema de Ensino de Araçariguama.





Augusto Cury – Para os
queridos profissionais do magistério, o sistema social pode não os valorizar na
proporção da sua grandeza, mas tenham a certeza de que, sem vocês, a sociedade
não tem horizonte, nossas noites não têm estrelas, nossa alma não tem saúde,
nossa emoção não tem alegria.





Queridos alunos, saibam que vocês
são imprescindíveis e insubstituíveis no teatro social. Não tenham medo de
falhar, e se falhar, não tenham medo de chorar e se chorar, repense sua vida,
mas não desista, dê sempre uma nova chance para si mesmo. Corra riscos, pois
quem vence sem risco, triunfa sem glória. Saibam lidar com os aplausos, mas não
se desesperem diante das vaias. Cada ser humano tem uma história magnífica,
potencial intelectual grandioso. Por isso, não se aprisione no cárcere do medo.
Seja o ator principal de sua vida. 



Forte abraço!

Fonte: Almanaque de Educação de Araçariguama



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